terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Observar os astros com meios simples


Existe a ideia corrente de que é necessário ter um enorme telescópio e grandes conhecimentos para conhecer o céu. Ou para fazer, com gosto e satisfação, algumas observações astronómicas, imaginado-se que estas estão fora do alcance do comum dos mortais.

Este falso pressuposto leva muitas pessoas a desistir de uma actividade fascinante onde os procedimentos básicos se aprendem no meio do entusiasmo, quase sem se dar por isso. Mesmo com equipamento simples, ou até sem ele, há imensas observações possíveis.

Observações a olho nu (sem instrumentos de óptica) 

É pelas observações a olho nu que devemos começar, pois um binóculo ou um telescópio serão praticamente inúteis se o observador não conhecer o céu: é preciso saber in­terpretar os sucessivos aspectos do céu, em datas e horas diferentes. E saber para onde apontar os instrumentos de observação. Conhecer o céu não é difícil e tem de ser feito a olho nu. Apenas é pre­ciso começar e "praticar com alguma regularidade". Serão também úteis alguns livros que funcionem como guias.

Veja alguns exemplos do que pode fazer a olho nu: 

Localizar e identificar as constelações no céu. 
Identificar as estrelas mais brilhantes, pelos seus nomes. 
Distinguir os céus típicos das diferentes estações do ano. 
Orientar-se pelas estrelas. 
Reconhecer ainda melhor as cores das estrelas. 
Distinguir entre estrelas e planetas. 
Verificar o movimento aparente da Lua e dos planetas Mercúrio, Vénus, Marte, Júpiter e Saturno em relação às constelações. 
Observar chuvas de meteoros e localizar proximadamente o seu radiante. 
Observar a Via Láctea (se a poluição luminosa for muito baixa).
Medir as distâncias angulares en­tre estrelas ou entre estrelas e planetas. 

E com binóculos? 

Um binóculo vulgar significa um grande progresso relativamente à vista desarmada: capta 50 vezes mais luz do que os nossos olhos! Através do binóculo, as estrelas aparecem muito mais brilhantes. E imensas estrelas invisíveis a olho nu vão revelar-se aos olhos do observador.

As observações melhoram muito em possibilidades e em conforto fixando o binóculo a um tripé fotográfico: há acessórios específicos para isso. Os binóculos mais convenientes para estas observações são os 7x50, onde o primeiro número antes do "x, representa a amplificação e o segundo número indica o diâmetro das lentes objectivas em milímetros (e também os 10x50).

Entre as observações possíveis estão as seguintes: 
Observar e reconhecer os principais "mares" da Lua. 
Observar as maiores crateras lunares. 
Observar o disco de Júpiter. 
Acompanhar o movimento de translação de quatro das luas de Júpiter.
Reconhecer as cores das principais estrelas. 
Observar algumas estrelas duplas. 
Observar muitas estrelas invisíveis a olho nu. 
Observar enxames de estrelas abertos e globulares. 
Observar diversas nebulosas. 
Observar algumas galáxias. 
Explorar a faixa da Via Láctea, que se revela uma imensidão de estrelas. 

Num local com pouca poluição luminosa, através de um binóculo, um observador atento poderá ver magníficos campos de estrelas, enxames de estrelas, algumas galáxias e até diversas nebulosas. A capacidade para discernir estes objectos ténues aumenta muito com o treino.

Para aproveitar a sensibilidade visual dos nossos olhos é preciso aguardar a adaptação dos olhos do observador à escuridão (pelo menos 15 min). Este cuidado dispensa-se no caso da Lua e dos planetas brilhantes.

Texto e mapas: Guilherme de Almeida (1#) / 2014 - Ciência na Imprensa Regional / Ciência Viva 

________
Para saber mais:
Guilherme de Almeida, "O Céu nas Pontas dos Dedos", Plátano Editora, Lisboa, 2013
Guilherme de Almeida. "Roteiro do Céu", Plátano Editora, Lisboa, 5.ª Edição, 2010
Guilherme de Almeida e Pedro Ré, "Observar o Céu Profundo", Plátano Editora, Lisboa, 2.ª Edição, 2004

1# Guilherme de Almeida nasceu em 1950. É licenciado em Física pela Faculdade de Ciências de Lisboa e foi professor desta disciplina, tendo incluído Astronomia na sua formação universitária. Realizou mais de 80 palestras e comunicações sobre Astronomia, observações astronómicas e Física, em escolas, universidades e no Observatório Astronómico de Lisboa. Utiliza telescópios mas defende a primazia do conhecimento do céu a olho nu antes da utilização de instrumentos de observação. Escreveu mais de 90 artigos de Astronomia e Física. É autor de oito livros: Sistema Internacional de Unidades; Itens e Problemas de Física–Mecânica (co-autor); Introdução à Astronomia e às Observações Astronómicas (co-autor); Roteiro do Céu; Observar o Céu Profundo (co-autor); Telescópios; Galileu Galilei; O Céu nas Pontas dos Dedos. A obra Roteiro do Céu foi publicada em inglês, sob o título "Navigating the Night Sky (Springer Verlag–London). O livro Galileu Galilei também está publicado em castelhano e catalão.