terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Astrónomos portugueses detectam exoplaneta Kepler-88c com base em previsão teórica

Uma equipa europeia, da qual faz parte Alexandre Santerne do Centro de Astrofísica da Universidade do Porto (CAUP2), usou o espectrógrafo SOPHIE3 para detectar a presença do Kepler-88 c.

Figura Artística do sistema Kepler-88. Crédito: Alexandre Santerne (CAUP)/ESO/Serge Brunier
A existência deste exoplaneta, que até agora não tinha sido detetado, foi prevista pela perturbação gravitacional, provocada no seu irmão que transita a estrela, Kepler-88 b. Com o SOPHIE, a equipa detetou e mediu a massa do Kepler-88 c.

“O SOPHIE é um instrumento capaz de medir a velocidade de estrelas com uma precisão equivalente à de medir a velocidade de uma bicicleta. Até agora foi usado para caracterizar quase 20 dos planetas do Kepler”, comenta Alexandre Santerne (CAUP), responsável pelas observações de estrelas do Kepler com o SOPHIE.

O principal objectivo do telescópio espacial Kepler5 (NASA) era a procura de trânsitos periódicos em centenas de milhares de estrelas, e durante os 4 anos que durou a missão, detectou mais de 3.500.

No entanto, nem todos os planetas no campo do Kepler são detectáveis por este telescópio, pois se o plano orbital estiver ligeiramente desalinhado com a linha de visão para a Terra, os planetas já não transitam e por isso são “invisíveis” para o Kepler.

Mas os planetas que orbitam a mesma estrela interagem gravitacionalmente uns com os outros. Esta interação provoca perturbações nos períodos de trânsitos previstos dos planetas. “A isto chamamos Variações no Tempo de Trânsito (Time Transit Variations – TTV)”, explica Susana Barros (LAM), a primeira autora do artigo.

Uma análise dinâmica detalhada à interação entre planetas, efectuada anteriormente pela equipa liderada por David Nesvorný (U. Boulder), previu que o sistema Kepler-88 tivesse dois planetas, um que transita (Kepler-88 b), e cujo período orbital é fortemente perturbado por um planeta que não transita (Kepler-88 c). Estes estarão numa ressonância 2 para 1, isto é, um planeta completa duas órbitas no mesmo período que o outro completa apenas uma. Esta configuração é semelhante à da Terra e de Marte, com o planeta vermelho a orbitar o Sol em cerca de 2 anos.

A técnica TTV é sensível a planetas até à massa da Terra, em sistemas múltiplos, e pode por isso ser usada para detectar a existência de planetas que não transitam, mas que provocam perturbações na órbita dos planetas que transitam.

“Esta é a primeira vez que a massa de um exoplaneta 'invisível', calculada com base em Variações no Tempo de Trânsito, é confirmada de forma independente por outra técnica”, comentou Barros.

Este resultado confirma que a TTV é uma técnica válida para a detecção destes planetas “invisíveis” em sistemas com múltiplos planetas. Neste momento a técnica foi já usada para determinar a massa de mais de 120 exoplanetas, até à massa da Terra, em 47 sistemas estelares.

“Esta confirmação independente permite antecipar o futuro da exploração de sistemas de exoplanetas a partir do espaço com a missão PLATO7, conclui Magali Deleuil, líder da equipa de exoplanetas do Laboratório de Astrofísica de Marselha (LAM).

Neptuno foi o primeiro planeta a ser detectado pela influência gravitacional que exercia sobre outro planeta (Urano). O matemático francês Urbain Le Verrier calculou que as anomalias na órbita de Urano eram devidas a uma ressonância 2 para 1 de um planeta que ainda não tinha sido observado. Os seus cálculos levaram Johann Gottfried Galle a encontrar Neptuno a 23 de setembro de 1846.

Ricardo Cardoso Reis (CAUP)
Ciência na Imprensa Regional – Ciência Viva