domingo, 25 de outubro de 2015

ESO / VLT: O beijo fatal de duas estrelas

Com o auxílio do Very Large Telescope do ESO, uma equipa internacional de astrónomos descobriu a estrela dupla mais quente e mais massiva, com as duas componentes tão próximas que tocam uma na outra.

As duas estrelas no sistema extremo VFTS 352 podem estar a dirigir-se para um final dramático, no qual fusionam para formar uma única estrela gigante ou então dão origem um buraco negro binário.

O sistema de estrela dupla VFTS 352 situa-se a cerca de 160 mil anos-luz de distância na Nebulosa da Tarântula. Esta região extraordinária é a maternidade de estrelas jovens mais activa no Universo próximo.

Novas observações do VLT do ESO revelaram que este par de estrelas jovens se encontra entre os mais extremos e estranhos alguma vez descoberto. O VFTS 352 é composto por duas estrelas muito quentes, brilhantes e massivas que orbitam uma em torno da outra com um período pouco maior que um dia. Os centros das estrelas estão separados de apenas 12 milhões de quilómetros.

As estrelas estão tão próximas que as suas superfícies se sobrepõem, tendo-se formado uma ponte entre elas. O VFTS 352 não é apenas o binário mais massivo conhecido desta pequena classe de “binários em contacto” — tem uma massa combinada de cerca de 57 vezes a massa solar — mas também contém as componentes mais quentes — com temperaturas efetivas de cerca de 40 mil graus Celsius.

As estrelas extremas como as duas componentes do VFTS 352 desempenham um papel fundamental na evolução das galáxias e pensa-se que serão as principais produtoras de elementos como o oxigénio. Tais estrelas duplas estão também associadas ao comportamento exótico de “estrelas vampiras”, onde uma estrela companheira mais pequena “chupa” matéria da superfície da sua vizinha maior.

No entanto, e no caso do VFTS 352, as duas estrelas do sistema têm quase o mesmo tamanho. A matéria não é por isso chupada de uma para a outra, mas sim partilhada. Estima-se que as estrelas do VFTS 352 estejam a partilhar cerca de 30% da sua matéria.

Este tipo de sistemas é muito raro, já que esta fase da vida das estrelas é muito curta e por isso é difícil encontrá-las nesta altura das suas vidas. Como as estrelas estão tão próximo uma da outra, os astrónomos pensam que as fortes forças de maré fazem com que haja uma maior mistura de material nos seus interiores.

“O VFTS 352 é o melhor caso descoberto até à data de uma estrela dupla quente e massiva que pode ter este tipo de mistura interna,” explica o autor principal do trabalho Leonardo A. Almeida, da Universidade de São Paulo, Brasil. “Como tal, esta é uma descoberta importante e fascinante.”

Os astrónomos prevêem que o VFTS 352 sofrerá um fim cataclísmico, fim esse com duas possibilidades diferentes. A primeira possibilidade será a fusão das duas estrelas, que muito provavelmente dará origem a uma rotação rápida, e possivelmente a uma única estrela magnética gigante [magnétar].

“Se o objecto continuar a rodar rapidamente, poderá terminar a sua vida numa das explosões mais energéticas do Universo, uma explosão de raios gama de longa duração,” diz o cientista principal do projecto Hugues Sana, da Universidade de Louvain-la-Neuve, Bélgica.

A segunda possibilidade é explicada pela astrofísica teórica da equipa, Selma de Mink da Universidade de Amesterdão, Holanda: “Se as estrelas estiverem bem misturadas entre si, ambas permanecerão objectos compactos e o sistema VFTS 352 poderá evitar a fusão. Este efeito levará os objectos a outro caminho de evolução completamente diferente das predições da evolução estelar clássica. No caso do VFTS 352, as componentes acabarão as suas vidas em explosões de supernova, formando um sistema binário de buracos negros próximos. Um tal objecto seria uma intensa fonte de ondas gravitacionais.”

Comprovar a existência deste segundo caminho evolucionário seria um grande avanço observacional no campo da astrofísica estelar. No entanto, independentemente do fim do VFTS 352, este sistema já deu aos astrónomos importantes pistas sobre os processos de evolução pouco conhecidos de sistemas binários com estrelas massivas em contacto.

Texto e foto: ESO